segunda-feira, junho 16, 2008

Frustração e demais sensações produzidas pela falta de calor

Hoje a capital paranaense amanheceu sob pouquíssimos graus centígrados. E pra piorar, negativos.

Mesmo antes do arrepiante solstício de inverno, já fomos devidamente amaldiçoados por aqui.

Ao raiar do dia, via-se geada por tudo quanto é canto.

Logo que saí pelo portão para, corajosamente, enfrentar mais um dia de labuta, ao vislumbrar um gramado esbranquiçado já na primeira esquina, mesmo sozinho ao volante de meu bólido esportivo coreano vermelho, não tive como conter um resmungo seguido de um conciso, porém substancial comentário, cujo conteúdo segue, na íntegra: “Merda!”

Pra quem não conhece tal infortúnio, o termo “geada” designa um estranho fenômeno observado em Curitiba e arrabaldes, no qual seres malignos de outras dimensões (provavelmente duendes com distúrbios de personalidade ou gnomos viciados em crack) espalham caóticas porções de gelo pelos gramados (outrora verdejantes) da região, pouco antes de embarcarem pra Salvador-BA a fim de fugir deste frio do cacete.

O próprio solstício de inverno é uma ode à depressão: O mesmo é, por definição, o momento em que temos a noite mais longa do ano. Em suma, é o ápice do período de trevas.

Todavia, há quem goste dessa época do ano, justamente em virtude do clima frio. Bizarro, concordo, mas relativamente aceitável, visto que há também quem goste de pedofilia, cropofagia, bestialismo, zoofilia ou funk carioca.

Essa velha história de que o frio é ótimo para apreciar um bom vinho sob o calor da lareira não passa de pura fantasia.

Não consigo ver a lareira, o conhaque, o fondue de queijo (coisa de gente afetada), o quentão de vinho ou o chocolate quente como opções de lazer, mas sim como meios de sobreviver ao frio dilacerante que nos assola nesta época.

Esquizofrenias a parte, diria até que certos níveis de frio, por notoriamente prejudicarem o direito universal de ir e vir, deveriam ser terminantemente proibidos.

Entre as inúmeras desvantagens do clima frio, como por exemplo, a transição da acalorada ducha ao arrepiável ambiente externo, ou a contumaz topada do frígido dedinho do pé no canto da porta do banheiro, ressalta-se a visita à “casa de força”.

Tal atividade, por, de certo modo, diminuir os níveis de dignidade do ser humano, torna-se especialmente apavorante em dias muito frios.

O simples fato de, já de calças arreadas, sentar em algo gelado já faz com que o cidadão procrastine tal atividade pelo maior tempo possível, ainda mais em casos complexos, em que, seja lá por que motivo, o processo exija prazos mais longos a fim de atingir o objetivo final.

Em alguns casos específicos, como já registrado em alguns vilarejos da Sibéria e da Groelândia, medidas extremas, tais como a utilização de fraldas geriátricas ou o corte de alimentos fibrosos da dieta alimentar durante o auge do inverno, por exemplo, se tornam plenamente plausíveis.

Quanto às necessidades fisiológicas de ordem líquida (vulgo mijadas) a coisa também se demonstra complicada, tanto do ponto de vista psicológico quanto operacional, visto que, salvo em casos específicos de indivíduos afro-descendentes, além das óbvias dificuldades de localização e manejo da ferramenta quando recolhida, alguns indivíduos sentem, tal qual o citado instrumento, seus espíritos também diminuídos, ao verem o pouco se tornar ínfimo.

Particularmente, prefiro não me abalar por tão pouco. Aliás, não quero falar sobre este assunto.

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segunda-feira, junho 09, 2008

Carta aos ETs, parte V - Dos dias da semana e da felicidade do ser humano

Carta aberta aos seres, proletários ou não, que vierem a tomar conta (ou terminar de arrebentar) esse mundão chamado Terra depois que nosso contrato vencer.


Pra quem perdeu a primeira parte.

Pra quem perdeu a segunda parte.

Pra quem perdeu a terceira parte.

Pra quem perdeu a quarta parte.


Embora tenha sido responsável pelo surgimento de inúmeros artifícios tecnológicos que viabilizaram o atual modo de vida ocidental, tais como o pão de forma, a bomba de chimarrão de aço inoxidável e o barbeador elétrico, não há como negar que os novos tempos também trouxeram certos infortúnios ao homem moderno.

Infortúnios estes, que foram incluídos no mesmo pacote pelas letras miúdas do contrato, e chegaram presos em alguma parte da grande locomotiva do progresso, que, ao menos enquanto ainda houver combustível a ser queimado (de preferência, que faça muita fumaça) insistirá por mais um bom tempo nesta longa e insana corrida, que começou em lugar nenhum e tem destino incerto e não sabido.

Pois bem. Mágoas à parte, já estamos (ou deveríamos estar) acostumados com esta tal “civilização humana”, que tem o detestável costume de afagar com uma das mãos, mas que com a outra cutuca os lugares mais inconvenientes.

De certa forma, algumas situações, normalmente crônicas e irremediáveis, mostram-se extremamente peculiares no tocante às frustrações humanas.

Um exemplo clássico é a percepção do cidadão mediano em relação às definições de “dia de semana”, “fim de semana” ou “feriado”.

Cá na Terra temos sete dias que se repetem ciclicamente, no intuito de formar conjuntos, aos quais chamamos de semanas. Não há como precisar donde surgiu esta idéia, porém, acredito que seja mais uma obra da própria natureza humana, que insiste em se mostrar periodicamente enfadonha.

Alguns afirmam que a idéia tenha sido dum camarada que há muito tempo atrás criou este mundo em seis dias e descansou no sétimo, e depois transmitiu esta mania tosca aos demais (os quais ele resolveu fazer à sua imagem e semelhança, só de sacanagem).

Outros afirmam que se trata duma grande manobra imperialista a fim de oprimir o povo a trabalhar durante cinco dias e descansar somente dois, de modo a fazer com que alguns poucos se locupletem com a mais-valia do processo.

Acredito que a primeira hipótese seja inconcebível no que tange à primeira regra de engenharia de projetos, que afirma categoricamente que prazos foram feitos para serem descumpridos. Em relação à segunda hipótese, minha religião não permite acreditar em tais teorias conspiratórias. Sou ortodoxo, mas sou limpinho.

De qualquer forma, para a grande maioria da casta proletária da humanidade, com exceção daqueles que possuem tetas pecuniárias permanentes (conhecidos, de forma pejorativa, como “funcionários públicos”) e dos que trabalham em funções extremamente específicas (degustação de cerveja, por exemplo), os níveis de contentamento com a vida costumam sofrer variações fantásticas em virtude das mudanças nos dias da semana.

Enquanto a simples menção da palavra “segunda-feira” causa enjôo, mal-estar, fadiga ou até tendências suicidas em certos indivíduos, o vocábulo “sexta-feira” é fonte perene de inspiração do amor, da poesia, da bazófia desmedida e de tantas outras fontes de contentamento.

Em situações cotidianas, os demais “dias úteis” não têm magia suficiente para ostentarem tais semblantes lúdicos, quiçá por não possuírem a tristeza sincera ou o júbilo exorbitante das segundas e das sextas, respectivamente.

Ou quem saberá ainda, se as terças, quartas e quintas não perderam aos poucos o brilhantismo em virtude da total falta de personalidade que mostram quando insistem em também usar o sufixo “feira”. Não há como precisar, mas uma coisa é certa: São dias insossos.

Já os feriados, são como aves migratórias carregadas de felicidade, que, procurando boas paragens para seus ninhos de regozijo, pousam despretensiosamente em dias quaisquer, salvo uma ou outra espécie de “dia certo”, como a pitoresca ave carnavalesca, por exemplo, que se mostra notoriamente mais perspicaz que as demais, especialmente em terras tupiniquins abaixo da linha do equador.

Porém, vez ou outra estas aves de feriado pousam em dias escusos, como os fins de semana. Neste caso, criam-se feriados redundantes, que são, basicamente, como espirrar na farofa: Uma besteira.

Quanto aos fins-de-semana, não há mais muito que se falar. São dois dias recheados de contentamento, em que o nível de felicidade proletária atinge seu ápice.

No intuito de ilustrar este sentimento, mesmo sem a devida vênia, parafraseio o grande Vinícius, quanto disse que: se há a perspectiva do domingo, é porque hoje é sábado.

Na mesma linha, a fim de completar a semana e estas mal traçadas, afirmo ainda que se a noite escura insiste em pairar sobre um dia cinzento de domingo, é porque há perspectiva de segunda-feira.

Ou então, de suicídio. O que acontecer antes.

Continua...


"E quando você menos espera,

Ele dá alguns mimos também.

Como o magnífico andar de uma

linda mulher, quatro passos

à sua frente....

ai ai ai ai.... (enorme suspiro)”

A.G.J.

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quarta-feira, junho 04, 2008

Pedagogia, filhos, surras e afins

Como não sabia o que escrever, resolvi divagar sobre algumas peculiaridades da minha infância, fazendo um paralelo aos métodos pedagógicos utilizados na educação do pequeno Otto (esse cara aí da foto), ao menos até eu ficar rico e mandá-lo pra um colégio interno.
Assim, ao invés de divagar sobre o mundo, desta vez divago sobre mim mesmo. Quem não gostar... Ah... P.N.C. de quem não gostar!


Nas últimas décadas, podemos observar uma notável mudança nos métodos pedagógicos empregados pelo cidadão médio (alguém conhece esse cara?) no tocante à educação de seus filhos, os cidadãozinhos médios.

O mesmo método que um dia já foi procedimento de praxe, hoje é enquadrado muito próximo ao crime de tortura, logo, algo abominável e desumano. Vide, por exemplo, as instrutivas palmadas na bunda, praticamente extintas do mundo dito civilizado.

Antes que algum psiconheconheco (neologismo emprestado*) de plantão venha me achincalhar, devo lembrar que há um leque infinitamente amplo de possibilidades para a punição de infantes, que vai desde a abstenção do monstrinho ao vídeo-game, até esganá-lo e tacá-lo do sexto andar.

Assim, ao menos pra quem ainda tiver algum (anda em falta no mercado, mas reza a lenda que está pra chegar mais), recomenda-se o uso de porções homeopáticas de bom senso em casos que exijam repreensões aos pequenos, principalmente em situações extremas, nas quais o ímpeto sadista dos pais costuma alcançar índices elevadíssimos, que deixariam até Pol Pot perplexo.

No tocante ao meu adestramento, certamente não há como afirmar se eu quico ou não, visto que nunca fui atirado do sexto andar. Porém, já levei uma ou outra palmada pedagógica quando moleque, e pro desespero dos defensores da anarquia juvenil, devo confessar que tais castigos não me causaram nenhuma grande seqüela ou distúrbio psicótico, ao menos em relação ao que foi descoberto pelas autoridades até o presente momento.

Tive uma criação peculiar.

Já nos tempos de bebê, fui poupado de algumas vacinas (se não me engano, as de campanha), já que segundo meu progenitor (que também tem lá suas teorias “fora-da-casinha”), estas serviriam para doenças praticamente erradicadas, praticamente inúteis, portanto.

Com antibióticos foi o mesmo esquema: Tomei-os, pelo que me consta, apenas uma vez, depois que vários dias de chá de boldo com mel e erva cidreira não resolveram o problema. Afinal de contas, remédios baixariam minha imunidade e, assim sendo, precisava esperar que a própria natureza fizesse seu trabalho. Remédios, só em último caso, e na maioria das vezes, aspirina ou própolis (que notoriamente, cura todos os males já catalogados).

Não tenho como saber se esta realmente foi uma boa decisão, porém, uma coisa é fato: Até hoje sigo muito bem, caminhando e cantando e seguindo o refrão.

Fora uma ou outra gripe ou uma eventual dor de garganta, ao menos pelo que me lembro, nunca senti sinais de quaisquer outras doenças, o que me faz concluir que, já que não as sinto, devo estar apenas transmitindo-as. Não pego doença, só passo: Coisa de gente assim, casca grossa.

Já nos tempos de escola, havia mais uma regra: Faltar aula, jamais. Doenças eram motivos para falta apenas se eu já estivesse agonizando, a enxergar uma forte luz branca no final dum túnel escuro...

Em uma ocasião curiosa, tive a amarga experiência de ser o único aluno da minha classe a comparecer à aula. Era dia de jogo da seleção brasileira (de futebol, por óbvio), e na véspera a professora havia dito que não precisaríamos comparecer, pois não haveria nenhum assunto importante. Afinal de contas, em dias de jogos decisivos o quórum costumava ser muito baixo.

Obviamente meu pai não acreditou na história, e me despachou pra escola. Acabei assistindo a aula em outra classe, onde havia outras quatro crianças... A situação só não foi totalmente frustrante, porque era época de festa junina, e por ali eu era o único ser vivo que sabia fazer balõezinhos de papel, o que me tornou praticamente um popstar naquele dia. Menos mal.

No mais, minha infância foi, com exceção de certas aulas de piano, relativamente sossegada e bastante divertida.

Porém, agora a situação se inverte. Com o advento do jovem Otto, fico eu no papel de progenitor (até que se prove o contrário), e ele, no de prole.

Em relação às vacinas, não tenho o mesmo embasamento acadêmico para suspendê-las, ficando esta parte, portanto, a mercê da doutora Carol (vulgo “Frau Gabardo”) e sua girafa de estimação. No tocante a indicativos, pelo tamanho e a cor das bochechas do guri, acho que ela está fazendo um bom trabalho. Como se diz nas longínquas terras do norte, sem a menor sombra de dúvida, esse “vingô”.

Quanto a regras, normas de conduta, valores morais e todas essas baboseiras que ninguém mais liga hoje em dia, eu penso que ainda seja um pouco cedo para maiores preocupações em relação ao guri, tendo em vista a recente data de nascimento deste (com cinco meses, o próximo desafio é ficar sentado sem cair pro lado).

De qualquer forma, como não podia deixar de ser, ele já vem seguindo as diretrizes oficiais da casa, criadas há certo tempo por mim e pela sua figura materna, a pequena Cláudia (que está no ranking das 10 melhores mães do sul do mundo), a fim de possibilitar uma convivência harmoniosa entre nós (agora) três, da mesma forma que já acontecia entre nós (antes) dois.

A fim de exercitar certos métodos hermenêuticos, optamos por uma constituição enxuta. Logo, são poucas premissas, mas todas de alto valor científico-moral, elencadas a seguir:

1) Nada de briga;

2) Nosso forte é a dança.

Até o presente momento, o jovem Otto vem se adaptando muito bem a todas estas regras, e vem demonstrando um grande talento para a dança, além de sofrer de “riso frouxo”, o que me leva a crer que seja mesmo oriundo de meus grãos.

Recomendaria ainda, que todos os leitores seguissem estas regras de convívio, no entanto, sei que o criador não foi generoso a ponto de distribuir o divino dom da dança a qualquer um. Assim sendo, peço que tentem ao menos não brigar. Já ajuda bastante, e evita perda de tempo.

Quanto ao pequeno Otto, minhas expectativas sobre seu futuro são excelentes. Sinceramente, espero que muito em breve ele se torne um brilhante articulador político, e chegue à condição de grande ditador das Américas, a fim de unir todo o continente sob seu comando. Algo meio assim, sem precedentes na história da humanidade.

Contudo, se ele for um cara gente fina e não virar veado, tudo bem, já fico satisfeito.

*Muito obrigado, Margit Müller, pela contribuição, ainda que não-autorizada.

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