quinta-feira, julho 31, 2008

Filósofos entram no terceiro mês de greve geral – HIPS anuncia que não há previsão de retorno

29/07/2008

PNC – Estocolmo.
Jürgen Von Häagendazs, presidente vitalício do sindicato internacional dos filósofos hermeneutas (Hermeneutics International Philosophers’ Syndicate, ou HIPS), situado na cidade de Helsingborg, Suécia, anunciou nesta última segunda-feira que não há previsão de encerramento para a paralisação geral dos filósofos.
A greve geral já completa dois meses, e se espalha endemicamente por todo continente europeu, além de já ter conseguido o apoio da conceituada sociedade de filosofia canadense (Crown Royal Canadian Philosopher’s Blended Society), que prometeu parar suas atividades na próxima sexta-feira, caso as exigências do HIPS não sejam atendidas.
O motivo do início da paralisação geral ainda não foi confirmado, mas especula-se que a greve tenha sido motivada pelas recentes declarações da ministra da integração artística da Suécia, a doutora Alberta Premium Spritdryck, que durante um discurso oficial para vários chefes de estado, afirmou que “aulas de filosofia são demasiadamente expositivas, além dos professores usualmente sofrerem desvios de personalidade”, e ainda, ao final do mesmo discurso, arrematou: “docentes de filosofia costumam ser péssimos exemplos para nossa juventude. Atividades esportivas me parecem muito mais saudáveis.”
A situação ainda é agravada pelo aumento assombroso das aulas de educação física em detrimento às disciplinas de filosofia, tendência que parece contaminar as escolas européias na última década, e preocupa os profissionais do ramo.
Jürgen Von Häagendazs, em entrevista exclusiva a PNC de Estocolmo, criticou duramente as afirmações da ministra, e a classificou como “uma mal resolvida concupiscente, aos moldes de Platão”. Afirmou ainda, que “a greve geral irá mostrar a verdadeira necessidade dos filósofos no mundo globalizado”, e ainda acrescentou que “sem o trabalho destes profissionais, o mundo entrará em colapso sócio-cultural muito em breve”, porém, não especificou quando seria seu ‘muito em breve’.
Os grevistas prometem continuar a greve até que o governo sueco tome uma posição oficial em relação à obrigatoriedade da disciplina de filosofia na ementa acadêmica do ensino médio. Além de exigirem um mínimo de 60 horas anuais para a disciplina, os filósofos lutam ainda pela distribuição gratuita de livros didáticos aos alunos, prática proibida na Suécia desde janeiro de 2005, quando a distribuição de notebooks a todos os estudantes da rede pública se tornou obrigatória. As escolas privadas já eram obrigadas a fornecerem computadores aos alunos desde março de 2001.
O prejuízo da greve já é estimado em cerca de dezenove milhões de coroas suecas, que serão sumariamente descontados pelas escolas dos holerites dos próprios grevistas, que já ameaçam fazer novas greves em represália.
Enquanto a situação não é resolvida, milhares de estudantes ficam sem aulas de filosofia. Segundo fontes extra-oficiais, sete alunos já registraram reclamações, contudo, os responsáveis da secretaria de educação do município de Helsingborg afirmam que ao menos três dos chamados não passavam de trotes.

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segunda-feira, julho 21, 2008

Long Dong Silver

Navegando por este mundo virtual, achei assaz peculiar o assunto deste post: http://guardacontigo.blogspot.com/2008/07/pra-comear-semana.html
Por vezes eu escuto (algumas vezes, até de bocas femininas) a velha conversa de que o calibre da espingarda não importa ao bom atirador, ou que o tamanho da varinha não é proporcional ao poder do feitiço, ou até que muitas vezes é preferível um pequeno brincalhão a um grande bobão...
Acho que o assunto destas (e de tantas outras expressões genéricas sobre o tema) é muito mais do que uma simples besteira. É, na realidade, uma total perda de tempo.
Explico: Caso este fosse realmente um fator tão importante assim, ou tão crítico para a operacionalização da brincadeira em si, provavelmente a abordagem feminina em relação ao assunto seria um pouco diferente.
Neste caso, acredito que o diálogo entre os namoricos de bares ou casas noturnas, acabaria, invariavelmente, tocando neste assunto.
Imagino a coisa mais ou menos assim:

Ele, mais ousado, decide fazer a proposta, com um olhar de galanteio:
- Então, já que agora nos conhecemos bem, e vimos que temos tudo em comum, sei lá, podíamos curtir o resto da noite num lugar mais sossegado... Você pode até achar besteira, mas acho que é coisa do destino esse lance da coleção de selos, e dos pesadelos com gelatina de abacaxi. Nunca achei que encontraria uma pessoa assim, tão linda, e que, ainda por cima, gosta das mesmas coisas que eu. E você, o que acha?
Ela responde um pouco envergonhada:
- Bom... Também fiquei deslumbrada pelo fato de você gostar das mesmas coisas que eu. Quando eu conto sobre a minha coleção de selos, os homens tendem a se distanciar. Mas você não. Até o lance dos pesadelos com gelatina de abacaxi!! Que sarro! Como é que pode!?
Ele insiste:
- Então... O que acha de irmos pra um lugar mais sossegado, e aproveitarmos juntos essa noite linda e estrelada? Está cedo ainda, e esta noite promete, minha querida...
Ela, alisando a ponta dos cabelos com a mão, responde:
- Pois então. Acho que a idéia não é das piores. Mas é que tem uma coisa...
Ele, um pouco confuso, completa:
- Como assim? Que coisa? Desculpe perguntar, mas... Você está naqueles dias?
Ela tenta se explicar:
- Não, não... O problema não é comigo. É com você. Ou melhor... Não sei ainda, mas pode ser com você. Não tenho como saber.
Ele tenta ajudar, fazendo-se de machão:
- Comigo? Como assim? Bom... Se o problema era eu, acho que não temos problema nenhum, gata. Nasci preparado. Bom... Você vai me ligar amanhã, não vai? hehehehe
Ela emenda:
- Não! Não é isso! É que eu não sei como explicar... Putz... Como é complicado dizer isso. Vocês homens são muito sensíveis.
Ele, serenamente, sentencia:
- Pode falar o que quiser. Comigo não tem dessa, não. Sou desencanado. Pode se abrir, docinho!
Ela, aliviada, responde:
- Bom... Menos mal... É que eu queria saber sobre o tamanho, sabe. Pra não perder a viagem, sabe... Afinal de contas, a balada ta boa hoje, né? Mas se você não se importa, que bom. A pergunta é: Quais são as medidas?
Ele, titubeante, já suando frio e engolindo seco, diz:
- Tamanho? Bom... Hummm... Tamanho, é... Ah... Bom... Tenho um metro e oitenta, setenta e sete quilos...
Ela, achando que ele não havia entendido, retruca:
- Dãããããrr....Não o seu tamanho, né!! O tamanho dele, saca? Do seu amiguinho. Como disse, não pretendo sair daqui por qualquer mixaria. Como eu já disse, a noite ta muito boa e o lugar ta bombando...
Ele, já sem saber onde enfiar a cara, tenta consertar tudo:
- Hummmm... Me veio uma coisa agora na cabeça... Você tinha dito filatelia, né? Veja só... Tinha entendido filantropia! Quando você falou sobre os selos é que caiu a ficha. Fiz confusão! Na verdade, odeio selos. Engraçado, não?
Ela responde, meio sem entender muito bem:
- Bom... Mas ainda temos em comum os pesadelos crônicos com gelatina de abacaxi, não é verdade!?
Ele, tentando sair pela tangente:
- Gelatina de abacaxi!? Bom... Tinha certeza que você havia dito pavê de maracujá... Confundi mesmo. Foi mal. É que os dois são amarelinhos, né...
Ela, então, ainda releva:
- Bom, tudo bem... Mas acho que isso não importa tanto no final das contas, não é mesmo?
Ele, já dando uns passos pra trás:
- Como assim, não importa!? Claro que importa! Pensando melhor, acho que não temos nada a ver um com o outro. De repente, podemos ser só amigos... Mas não amigos coloridos, né... Afinal, não temos nada em comum mesmo...
Ela, já conformada, rebate:
- Bom... Já que prefere assim, tudo bem. Sem problemas. Mas você não ficou chateado com a minha pergunta, ficou?
Ele, um pouco transtornado, solta essa:
- Claro que não!! E, aliás, caso alguém perguntar, ele é enorme. Mal cabe na cueca. Tive até que mandar trazer umas cuecas importadas. Vieram lá da Nigéria. Você sabe que por lá o pessoal não é fraco, né... Às vezes ele me atrapalha um pouco, mas eu convivo bem com isso. A gente acaba acostumando, sabe...
Ela tenta de novo:
- Ah... Legal! E que tal se...
Ele, interrompendo-a no meio da frase:
- Putz... Meu amigo ta me chamando ali no bar. Acho que ele bebeu demais e não ta legal. Melhor eu ir lá ver.
Ela, sem muita opção:
- Ah... Tudo bem. Vai lá, então...
Ele, já saindo pela direita:
- Então ta. Prazer em te conhecer, viu! Tchau, e até mais! A gente se cruza!
Depois do terrível diálogo com a moça, ele sai andando cabisbaixo em direção ao bar, mas ainda esboça um sorriso quando encontra seu amigo no balcão, e solta:
- Cara... Mais uma regulando mixaria... Essas mulheres de hoje estão muito recatadas, cara... Cadê aquela promiscuidade saudável de outros tempos!?? Foda, meu!
Eis que o amigo responde:
- Que merda, cara... Tinha certeza que essa você furava facinho... Mas a vida é assim mesmo. Dá nada. Parte pra outra!
E ele:
- Cara, mudando de assunto, lembra aquele e-mail que você comentou agora pouco, sobre a tal bombinha sueca, com motor de dois tempos, compressor turbo e três níveis de sucção, pro esquema de alongamento peniano?
O amigo responde, já com um sorrisão na cara:
- Sei sim! Hilário aquilo, cara... Que tipo de gente compraria um troço daqueles?? Bizarro!!
E ele arremata:
- Bom... É que eu queria sacanear um amigo... Encaminha o e-mail pra mim...?

Talvez eu tenha exagerado um pouco, mas minha mente, ao contrário de algumas outras partes, é assim mesmo: exagerada.
No mais, vou me virando com o que tenho. Não é lá tudo aquilo, mas já me quebrou algum galho... E também, agora já me afeiçoei a ele.
Na verdade, não quero nem mais falar sobre isso. Fico por aqui. Chega.
E se por acaso alguém tiver recebido o e-mail com informações sobre a tal bombinha sueca, por favor, me encaminhe.
É que eu quero sacanear um amigo, sabe...

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quinta-feira, julho 17, 2008

Aventura em Texas City

Mesmo ainda não muito habituado aos costumes do remoto Texas, aquele velho pistoleiro decidiu que a noite pedia uma visita ao Saloon local, já que a umidade relativa do ar se mostrava propícia a uns tragos de uísque. Cowboy, claro. E em copo sujo, por óbvio.
Enrolou um cigarro, encilhou a égua (suas concepções religiosas ortodoxas não o permitiam montar cavalos), e mesmo com algum receio em encontrar o xerife local, seguiu seu rumo pelas escuras vielas de Texas City.
Sem a antiga barba, o cartaz de ‘Procura-se vivo ou morto’ pregado na porta da delegacia já não oferecia grande perigo, pensou ele.
Porém, ao menos nas profundezas de sua alma, ainda pairava certa frustração por não ser mais reconhecido e, principalmente, temido como em tempos idos.
Afinal de contas, a vida de célebre pistoleiro sempre havia proporcionado momentos de glória e reconhecimento. Poucos tinham um gatilho tão rápido ali pelas bandas do oeste...
Mas a situação haveria de mudar. Era só uma questão de tempo.
Embora apenas alguns poucos soubessem, por trás daquela face sisuda, que já revelava alguns sinais do tempo, residia um espírito altivo, quiçá surgido nos áureos tempos em que viveu sob os longínquos parreirais sicilianos, onde além de aprender o nobre ofício de carabinieri, teve seus primeiros contatos com o amor e a poesia. Conseguiu tornar-se letrado nas belezas do mundo e da vida, mesmo naquele povoado tão frio e notoriamente xucro, mas que, ao menos nos confins de seus pensamentos, ainda carregava doses exageradas de nostalgia.
O que o havia trazido ao Texas, já não importava mais.
Afinal, a sede de aventura poderia tê-lo levado a tantas outras paragens, mas o acaso, este piadista incorrigível, tinha o deixado ali, em Texas City.
Entrou no Saloon como todo pistoleiro deve entrar, chutando a porta e logo pedindo ao garçom o primeiro trago.
Outros pistoleiros da região o olharam com certo ar de condenação e inveja, mas o brilho questionador e a tonalidade inquietante de suas pupilas não deixavam dúvidas: Não estava ali pra brincadeiras, e não seria nenhum matuto de Texas City que atrapalharia a sua noite.
As cortesãs do recinto se alvoroçaram, procurando saber quem era o distinto cavalheiro, desconhecido por aquelas bandas.
Com seu porte físico avantajado e sua voz invariavelmente rouca, nosso herói costumava chamar a atenção do mulherio, mesmo sem dar início aos galanteios, que eram, na realidade, o seu grande forte.
Entre um e outro trago, lançava olhares lancinantes às jovens incautas, que correspondiam suas intenções com sutilezas mil, mas tentavam desesperadamente esconder suas vontades sob a capciosa máscara da moralidade.
Com sua vítima devidamente escolhida dentre o rebanho, pôs-se a andar na direção da presa, sem desviar o olhar de predador.
O bote foi certeiro e a presa não teve a menor chance, uma vez que o caçador, mesmo sozinho, trazia consigo alguns capangas.
A saída da direita foi coberta pelo terrível Fernando “the dirty” Pessoa, e a da esquerda, pelo imundo Vinícius “crazy horse” Moraes.
E assim, como ele se posicionara bem no front do tiroteio, um beijo foi inevitável.
Conversas singelas e abraços impetuosos seguiram-se sob as bênçãos da lua, e ao final da noitada, a jovem ainda fez questão de levá-lo, em sua própria carruagem, ao o hotel onde estava hospedado.
Naquela noite, o destino não o permitiu mostrá-la a magia do amor siciliano, mas este era um detalhe sem grande importância, já que ela, na ânsia de reencontrar o célebre bandoleiro, haveria de voltar.
Ele, já tão cansado pelo furor da boemia, dormiu envolto em tranqüilidade, e sonhou como há tempos já não sonhava.
Sonhou com uma jovem misteriosa, de cabelos escuros e pele alva, com a qual corria de mãos dadas sob os parreirais sicilianos.
Ao acordar, ainda havia em sua mente alguns resquícios adocicados do sonho fantástico, e então, em meio a um suspiro, praguejou:
- Ah... Se eu te pego, você nem sabe...

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terça-feira, julho 15, 2008

Do balípodo tupiniquim

Desde os tempos de dente-de-leite, não sou grande entusiástico do tal futebol. Não apenas do futebol, mas de quaisquer jogos, genericamente.
O jogo é um vício que eu não tenho, felizmente. Já os demais, coleciono um ou outro.
Porém, da mesma forma que, mesmo sem grande empolgação, juntava-me aos demais pirralhos para horas ininterruptas de jogatina revezando-se em jogos do ATARI (afinal de contas, essa coisa de salvar a fase e continuar depois veio somente alguns anos mais tarde), algumas vezes (raríssimas vezes) algum cidadão me convence a assistir uma partida de balípodo, in loco.
Mas nas poucas vezes que freqüentei jogos em estádios, como definitivamente não me empolgo com toda a correria da rapaziada em campo, tentei sempre focar somente no essencial, que é, por óbvio, a cerveja.
Mas o triste é que dentro dum estádio acaba-se não fazendo nem uma coisa nem outra: O beber e conversar atrapalha o jogo, e o jogo atrapalha o beber e conversar.
De qualquer forma, ao menos por aqui, seguindo a nova política do “não se divirta”, a cerveja foi banida dos estádios, e o único argumento que me fazia ir a jogos caiu por terra.
Quanto às minhas crenças futebolísticas, sou coxa-branca, não ortodoxo, não praticante. Por parte de pai.
Portanto, nunca entendi muito bem a tal magia do ludopédio brasileiro.
Afinal, por aqui este esporte é praticamente exclusivo, responsável por pelo menos noventa por cento do conteúdo de aulas de educação física, programas esportivos, cadernos de esportes, ou qualquer coisa relacionada a “esporte”.
Claro, entendo que um pouco do brilho venha do fato de termos os melhores jogadores do mundo, afinal de contas, no Brasil todas as crianças tentam entrar para este ramo, ao menos em algum momento da vida. E como não poderia deixar de acontecer, de milhares de candidatos, alguns acabam mostrando-se jogadores-natos.
Porém, certamente isso teria acontecido com qualquer outro esporte que porventura pudesse ter sido escolhido como paixão nacional.
Explico: Se todas as crianças brasileiras sonhassem em virar jogadoras de pelota basca, por exemplo, acredito que, no frigir dos ovos, daria tudo na mesma. Em pouco tempo ter-se-ia aqui os melhores peloteiros bascos (???) do mundo. Desde que se fanatize a coisa, claro.
Logo, cabe aqui pergunta: Então, porque diabos o escolhido foi o futebol?
Há quem diga que é pela facilidade de se jogar em qualquer lugar, desde que se tenha quatro tijolos (que podem ser substituídos por chinelos) e algumas meias velhas, tornando-se assim, um esporte altamente democrático.
Mas isso é tudo balela. Uma explicação bonita, mas que não passa de conversa fiada.
Tantos outros esportes precisam a mesma pouca estrutura para a prática, e alguns até menos ainda.
Assim, só me resta crer que o futebol foi escolhido como paixão nacional por um simples motivo: Porque é o esporte mais corruptível que temos.
Embora a última frase possa ter soado tanto quanto ardida aos espíritos mais entusiastas e apaixonados, ela tem a sua lógica.
Afinal, além de o futebol ter se tornado um grande negócio, é um esporte que não tem tempo de duração fixo, onde apenas um gol pode decidir o jogo, onde um pequeno deslize de apenas um jogador pode mudar o rumo de tudo, onde abundam regras que dão carta branca ao juiz para as mais curiosas interpretações (marcar impedimento, fazer voltar um pênalti, etc.), além das bizarrices standard, como a decisão do jogo por pênaltis ou a morte súbita...
Sinceramente, não conheço nenhum outro esporte coletivo onde as possibilidades de manipulação de resultados sejam mais favoráveis.
Assim, só posso concluir que, realmente, o futebol não é apenas mais um jogo.
O futebol é apenas mais um circo.
Agora, só resta saber de qual lado estão os palhaços...

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domingo, julho 06, 2008

I don't want to stay here...

Sinto um forte nó na garganta quando escuto alguém dizer que é de Salvador, Bahia. Um sentimento que pode ser definido como uma miscelânea de tristeza, inveja e desalento, quase sempre seguido de um suspiro sincero, de quem já sabe que existe um mundo muito melhor lá pra cima das bandas de Campina Grande do Sul...

Nasci e fui criado na fria e cinzenta capital paranaense, onde estabeleço residência até o presente momento, e desconfio que essa minha mágoa tenha nascido aos poucos, durante as duas vezes em que visitei a capital da alegria.

Há quem ache um exagero de minha parte, mas acredito que o ar daquele lugar contenha certa dose de felicidade no seu estado mais puro. Tanto é, que pessoas com pulmões desacostumados a respirar o ar baiano, podem apresentar alguns efeitos colaterais, como ataques de riso inexplicáveis, alegria convulsiva, ou até diarréia, sendo que esta última costuma ser injustamente atribuída ao acarajé e a tantos outros quitutes a base de muito óleo de dendê e pimenta.

Não costumo e nem gosto de falar sobre o assunto, mas em virtude de certas complicações clínico-geográficas no momento do parto, não pude ter uma vida normal, feliz e saudável: Ao invés de nascer em Salvador, acabei vindo ao mundo na gélida capital paranaense.

Portanto, como já iniciei a vida num engano ardiloso, já não tenho a menor sombra de dúvidas de que o universo conspira contra minha pessoa.

E pra piorar o quadro patológico, quando ainda bebê, acabei criando alguns problemas crônicos de saúde, como pele branca, cabelo loiro e olhos azuis. Sintomas típicos de pessoas não adaptadas ao astro rei, logo, condenadas a viver o resto de suas vidas a base de antídotos extremamente inconvenientes, tais como filtro solar fator trinta, guarda-sol, as mais estranhas pomadas e cremes para queimaduras, além do remédio universal contra a desidratação (ao menos, da alma): a cerveja.

Poderia ser pior, claro.

Porém não tenho a menor sombra de dúvida de que houve um erro logístico deste palerma inescrupuloso, chamado Destino: Eu, por óbvio, deveria ter nascido na capital baiana.

Aliás, sou praticamente um baiano, ao menos no tocante à agilidade do espírito, e ao controle de estresse. Só me faltam o verão eterno e um berimbau.

E pra quem não achou história suficientemente triste, além de todas estas mazelas, ainda há mais um infortúnio a ser gentilmente incluído nos anais da biografia deste que vos escreve estas mal traçadas: Fui acabar estudando engenharia elétrica.

Assim sendo, acabei me tornando um cara entediado, sem sol, sem mar, pálido (mais especificamente, cor-de-rosa), e proprietário de um “bimbim” (nada assombroso, mas até quebra um galho), enquanto poderia ser um afro-descendente descolado, exímio tocador de pandeiro e enganador de turistas, que arrepia na capoeira, mora na beira da praia e tem um “membro” de assustar as donzelas mais exigentes.

Em suma: Minha situação é lamentável.

E tudo isso por culpa dum pássaro estúpido que, provavelmente embriagado, errou as coordenadas do destino.

Um erro crasso duma cegonha parva, e que já não pode mais ser corrigido.

Como diabos alguém consegue confundir o elevador Lacerda com a Torre da Telepar, ou então, o farol da Barra com a caixa d’água do alto da XV??

Nada contra o bom e velho Largo da Ordem, que por ostentar um paradoxo no próprio nome tem lá a sua magia, mas que, convenhamos: Não chega ao nível de regozijo ecumênico encontrado no célebre Pelourinho.

O que mais precisa ser comparado? O cândido desfile de carnaval da Avenida Cândido de Abreu, e a folia “ad eternum” da capital baiana?

Ou quem sabe, um marzão azul, quase infinito, e o adubado lago do parque Barigüi?

É... Definitivamente, o inverno me incomoda.

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VOU-ME EMBORA PRA PASSÁRGADA

Por Manuel Bandeira

Vou-me embora pra Passárgada

Lá sou amigo do rei

Lá tenho a mulher que eu quero

Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Passárgada

(...)

Em Passárgada tem tudo

É outra civilização

Tem um processo seguro

De impedir a concepção

Tem telefone automático

Tem alcalóide à vontade

Tem prostitutas bonitas

Para a gente namorar

E quando eu estiver mais triste

Mas triste de não ter jeito

Quando de noite me der

Vontade de me matar

- Lá sou amigo do rei -

Terei a mulher que eu quero

Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Passárgada.

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terça-feira, julho 01, 2008

Junte-se aos bons, e será um deles

Tudo o que aqueles dois queriam era uma noite de algazarra sincera, como aquelas que costumavam acontecer nos tempos idos, nunca esquecidos.

Relembrar um passado recente, antes de largarem a vida desregrada - ao menos em parte...- e morarem sob o mesmo teto, juntos com aquele anãozinho simpático - acho que é um gnomo - que responde pelo nome de Otto. Meio mala às vezes, mas no geral, gente finíssima.

Afinal de contas, há poucos meses atrás, acordar de ressaca no sábado ou no domingo era coisa de praxe. Cotidiano. Procedimento de rotina.

As ressacas eram inconvenientes, por óbvio, como todas as ressacas devem ser. Mas ainda assim, suportáveis.

Algumas bem leves, das que proporcionam uma zonzeira sutil, e aquela leve sensação de fora-do-ar, que beira o agradável.

Já em casos mais extremos, a coisa era de arrepiar os cabelos das regiões mais longínquas do corpo do sujeito, e a simples menção da palavra "álcool" - substituir a palavra "álcool" pela(s) bebida(s) da véspera - trazia desejos de morte ou de dor, no maior estilo Lupicínio, a quem parafraseio nesta ocasião, a fim de melhor ilustrar estes sentimentos:

(...) Deixa-me sofrer que eu mereço,
Por um pouco que padeço,
Não paga um terço do que fiz,
É tão grande, tão horrível, meu pecado,
Que eu sendo assim castigado,
É que me sinto feliz. (...)

Claro, sempre há pessoas com os nervos de aço, sem sangue nas veias e sem coração, que não conseguem entender a profundidade espiritual da ressaca. Mas, sinceramente, não sei se passando o que eu passo, não lhes venha qualquer reação: Afinal, o método empírico é sempre muito mais didático.

Enfim, o dia seguinte nunca é realmente agradável, mas também não é nada que um coquetel Molotov contendo aspirina, paracetamol, engov, hipocler, eno, pó de café e porções homeopáticas de vodka não resolvam.

E foi assim que eles, num estado de iluminação espiritual – em alguns bairros, chamado de "estado de embriaguez" -, decidiram que se fazia necessária uma festinha. Com urgência.

Uma noitada sem maiores pretensões, com local certo, mas sem quaisquer cronogramas.

Uma noite pra escutar um bom som, beber uma boa bebida, e, com a devida calma e serenidade que a atividade merece, falar muita merda. Travar aquelas conversas que começam numa discussão sobre a cor do rótulo da cerveja, e que, passando por assuntos tais quais a metafísica, a crise no oriente médio, o carro movido à água, ou a melhor marca de chimarrão, nos fazem concluir que a migração das andorinhas não é mais como era antigamente, como nos bons e velhos tempos, quando os videogames tinham um botão só. Ou você pulava, ou atirava. Ninguém pula atirando! Não é de Deus!

Para tanto precisavam, basicamente, de duas coisas: Uma data, e um local.

Abster-se-iam de motivos. Afinal, é de conhecimento notório que as melhores festas não têm motivo algum. Faz-se indispensável apenas o "animus festandi", que junto com algumas doses de vodka ao sair de casa, criam no cidadão os níveis necessários de entusiasmo.

Um bom dia, um bom bar.

Embora suas companhias recíprocas já fossem suficientes para locupletarem seus objetivos no evento, e até que se prove o contrário, na vida, chamariam ainda, quem cruzasse seus caminhos em tempo hábil.

Estariam automaticamente convidados todos que se habilitassem para tanto. As metas estavam traçadas: Beber cerveja, falar merda e rir à beça.

O dia, que fosse sexta-feira, posto que costumava dar sorte. O anãozinho que arrumasse pouso na casa das vovós, que estão aí pra isso mesmo.

E assim foi decidido

Agora, que se faça cumprir.

O lugar chama Empório São Francisco. Um dos melhores bares da capital paranaense, pelo menos na humilde opinião deste que ora escreve, embora o mesmo tenha lá suas razões nostálgicas para tanto. Mais informações: http://www.emporiosaofrancisco.com.br/

A sexta-feira será esta, agora, do dia 4 de julho de 2008.

A solenidade terá início quando o bar começar a ficar bacana, e a saideira só vem quando for vontade do criador. Salvo proposta irrecusável.

Junte-se aos bons, e será um deles.


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Devagar me ensinaram a não correr perigo
Por Marcelino Galeano

Devagar me ensinaram a não correr perigo
A esquecer das dores
A trabalhar desde cedo
A dignar-se pelo labor sem pensar
Só o labor de suar
Fizeram-me acreditar
Que abateria o medo.
Sonhar era coisa de vadio
E aflito era coisa de ingrato
Provar que não era frio
Era locupletar-se com a família num domingo debruçado no prato
Quiseram assim, mas não conseguiram,
Deixaram escapar suas vísceras
Ao remédio destemido não mediram
As mínimas.
Choraram no seu túmulo
Mas continuaram sorrindo amarelo
E profundo.
Da vida à graça
A morte, à desgraça.
não poderia ser diferente?
Alguém não poderia fazer o contrário
Parar de botar banca de crente, otário
E gritar aos pombos da praça
Que paz, não se mede com farsa
Paz se sustenta no temerário
Paz é alegria de ser livre
De não acorrentar-se nas provações
Do príncipe.
De esquecer a medida improfícua
Daquilo que não existe
Paz, é ver belo
o olho que chora triste.

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